A exposição, que já circulou vários lugares do país, chega à capital mineira no mês da Consciência Negra apresentando híbridos que transitam entre pintura, escultura e relevo formando uma mostra que convoca o público a uma imersão na diáspora (dispersão) africana e na racial brasileira. A visitação é gratuita
Depois de Brasília, Blumenau, Rio de Janeiro, Niterói, Recife, Salvador e Porto Alegre, é a vez de Belo Horizonte receber a mostra que convida o público a uma imersão estética e sensorial na questão racial e suas consequências na sociedade contemporânea brasileira. Trata-se da mostra Sanagê Pele e Osso do artista plástico Sanagê Cardoso. A exposição, que é resultado de mais de quatro anos de pesquisas de materiais e de texturas, acontece na Funarte MG, de 14 de novembro a 10 de dezembro. A entrada é gratuita sem necessidade de retirada de ingressos.
Inicialmente, a linguagem é direta. Telas e o objeto escultórico se referem a alguns dos países africanos de onde saíram e por onde passaram homens, mulheres e crianças capturados e vendidos como escravos para trabalhar em fazendas e minas no Brasil. Os mapas são regiões de circunscrições de uma experiência, uma projeção subjetiva de um sujeito que reconhece seu lugar ou não o reconhece como tal e pensa a questão geográfica como condição imaginária em direção a uma projeção fantasiosa.
É através da pesquisa do artista carioca com a espuma expandida – material muito utilizado na construção civil para assentar portas e batentes – que utilizou sua forma bruta para criar volumes e texturas. Num primeiro momento, há o encantamento com a matéria e suas possibilidades. Sanagê assemelhou o material à textura e cor de peles, ossos, fissuras e ligamentos. Foi a partir dessa experimentação que o artista se aproximou de um tema que lhe é muito próximo: A diáspora africana e suas consequências.
Imersão e vertigem – As telas escultóricas, objeto escultórico e sala de exposição foram pintados de branco. O artista explica que, ao optar pela cor que contém e reflete todas as cores, conduz o visitante a uma experiência de espaço infinito. “O branco é a presença diáfana que simboliza uma ausência de limites. Porém, além de uma escolha estética, a cor também é política. Assim como as telas que contêm relevos e texturas que não representam os relevos ou acidentes geográficos dos países africanos, a cor também não se refere a uma realidade. É uma provocação para a reflexão sobre passado, presente e futuro”, provoca.
Nesse lugar da experimentação, ele alcança a conjunção favorável de um trabalho com pé na pintura e um desdobramento imediato em relevo e escultura. As estruturas de espuma são rasgadas, serradas, quebradas e coladas entre elas e sobre a tela. “O que existe por trás dessas ações é um processo de violência”.
Legado – A história é implacável, não permite que fatos e casos sejam ocultados. Enquanto o tempo não faz o seu papel de resgate e compromisso com a verdade, no nosso caso o caminho a ser trilhado é tão grande e tortuoso que a esperança de dias melhores é um legado reservado às futuras gerações. Refiro-me às questões oblíquas do processo e sistema racial, destacadamente, no Brasil. “Quando nos referimos ao racismo, estamos sempre propensos a destacar questões que o cenário educacional nos apresenta mormente de forma fantasiosa. A literatura escolar sobre a importância e o legado da cultura negra, além de tendenciosa, é extremamente fraca em seu conteúdo, deixando nítido seu gesto marginal. Ou seja, estamos recebendo invariavelmente um legado pobre que não permite uma interpretação isenta e analítica dos momentos”, explica.
Sanagê Pele e Osso busca, de forma tímida, porém consistente, despertar alguns desses fatos e momentos, trazendo luz a questões que possam motivar a releitura de aspectos históricos importantes, considerando que nada é definitivo. Esta exposição é uma fagulha nesta proposta e entendimento da questão. Valores colocados à disposição do negro nos tempos recentes não são favores, são direitos vilipendiados que buscam minimamente contemporizar a desejada igualdade de condições. Mesmo reconhecendo se tratar de uma ação maniqueísta, podemos repousar neste fato a possibilidade de um futuro alvissareiro.
Portanto, Sanagê Pele e Osso é um exercício constante e infindável, se entendermos que esta causa não tem fim. É um fazer diário e sistemático, com forte tendência a nos levar ao exaurimento. O processo de desenvolvimento das obras é contínuo e trata-se de um registro pontual e momentâneo. Em Belo Horizonte, a mostra acontece com o apoio da Funarte Nacional de Artes – Funarte MG.
Quem é o Artista – Sanagê Cardoso é um artista plástico, nascido no Rio de Janeiro/RJ, numa família com um casal de irmãos. Chega a Brasília em 1972, com a mesma história de todos, em busca de qualidade de vida e pelas oportunidades. Experimenta várias atividades, mas o pendor para as artes se materializa na fotografia. Com um trabalho autoral e conceitual tendo o clips como poética e desenvolvimento.
Quando abandona a fotografia, resolve transformar as imagens abstratas e trazê-las para o plano tridimensional, fazendo da escultura seu ponto de partida. Para melhor desenvolver sua arte, buscou formação acadêmica na Faculdade de Artes Dulcina de Moraes, em Brasília.
Tendo participado de diversas exposições individuais e coletivas, hoje contabiliza obras que fazem parte do acervo de alguns museus de arte contemporânea. Desde então, tem uma produção independente orientada pela linguagem neoconcretista.
CONVERSA COM O ARTISTA – Dos dias 14 a 17 de novembro, o público terá a oportunidade de conversar com o artista sobre as obras e processos de criação e referência.
Serviço: A mostra Sanagê Pele e Osso Data: de 14 de novembro a 10 de dezembro Horário: segunda a sexta-feira, de 11h às 18h e sábado de 13h às 18h Local: Funarte MG – Rua Januária, 68, Centro – Belo Horizonte A entrada é gratuita sem necessidade de retirada de ingressos |