Ecossistemas de Inovação aberta com a Inteligência Artificial podem fazer o Brasil avançar

Por Durval Jacintho

A comunidade científica no Brasil comemorou o crescimento do país no ranking de inovação da Organização Mundial de Propriedade Intelectual (OMPI) da ONU, que, em 2023, alcançou a 49ª posição em análise de ecossistemas de inovação de 132 países. Em 2015, o Brasil ocupava a 70ª posição e agora é o líder na América Latina e Caribe. Contribuíram para o avanço de posição a melhora em alguns indicadores como serviços governamentais online, número de marcas registradas e principalmente a existência de mais de 20 unicórnios (startups que atingiram valor de mercado superior a US$ 1 bilhão) em 2022.

Entretanto, para um país que figura entre as 10 maiores economias do mundo medida pelo Produto Interno Bruto (PIB), ainda há muito espaço para crescimento neste ranking de inovação, que, segundo especialistas, pode ocorrer se o Brasil utilizar melhor o ecossistema de inovação aberta, integrando os setores acadêmico, científico e empresarial.

Uma janela de oportunidade para melhorar a inovação e a produtividade da economia brasileira se abriu com as aplicações da inteligência artificial, ao superar gargalos em áreas como educação e pesquisa e foco em setores com maior vantagem comparativas, como uso da IA em soluções para o enfrentamento das mudanças climáticas, geração de hidrogênio verde e a criação de novos medicamentos e terapias no Sistema Único de Saúde (SUS).  O alemão Klaus Schwab, fundador do Fórum Econômico Mundial e criador do conceito da Quarta Revolução Industrial disse em recente visita ao Brasil que “as transformações promovidas pela nova economia verde e o avanço da inteligência artificial, fornecem uma oportunidade de pular etapas de avanço e promoção de um rápido desenvolvimento tecnológico, processo conhecido na comunidade de negócios como leapfrog (salto do sapo)”.

Para isto, é preciso uma mudança cultural nas organizações que passa por planejamento, foco em processo, recursos humanos e financeiros. Em agosto deste ano, o governo federal anunciou um programa de investimentos de R$ 60 bilhões até 2026 para inovação.  A Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii) investiu R$ 446,3 milhões em projetos de IA de 330 empresas, que resultaram em 184 pedidos de propriedade intelectual e, juntamente com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), anunciou a liberação de R$ 178 milhões em recursos não reembolsáveis para a criação de três centros de competência em tecnologias.

São notícias alvissareiras, mas é preciso mais, o que pode ser obtido pela busca por recursos em instituições internacionais de fomento a P&D, parcerias público-privadas focadas em inovação tecnológica usando a IA e maior governança sobre o uso dos recursos aplicados.

A inovação sustentável deve vir do trabalho em conjunto com entidades setoriais e de incentivo a médias e pequenas empresas, como na  Estratégia Nacional de Ecoinovação do MEI – Mobilização Empresarial pela Inovação, lançada em setembro entre a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e o Serviço Nacional de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE), com a visão de que a IA pode ter um papel importante na coleta, análise e interpretação de grandes conjuntos de dados climáticos, de biodiversidade e de emissões de carbono.

As empresas também devem fazer sua parte para acelerar a inovação e aumento de produtividade com a  IA, seja no recapacitação de profissionais para lidar com novos aplicativos de inteligência artificial em seus processos, na discussão e no planejamento sobre novas formas de trabalho com o uso da IA Generativa, no maior protagonismo dentro de ecossistemas de inovação aberta, buscando parcerias com startups para acelerar aplicações da IA, bem como incentivar o intraempreendedorismo – a inovação proposta e gerida por colaboradores que “pensam com donos do negócio” e utilizam seu conhecimento da empresa e as dores dos clientes – em busca de mais produtividade.

Atualmente as ferramentas de IA já entregam resultados em todos os setores econômicos, como por exemplo no agronegócio (detecção de ervas daninhas por maquinário agrícola e ordenha automática de vacas), na saúde (identificação precoce de doenças, monitoração de estado clínico de pacientes para prevenção de acidentes vasculares e ataques cardíacos e na aceleração na pesquisa de fármacos), na educação (geração de tutoriais online para aprendizado, fornecimento de sugestões de conteúdo educacional, controle de desempenho de alunos, geração de programas customizados de acordo com perfil e necessidade do aluno) na segurança e prevenção de roubos (de dados confidenciais, transacionais e até de carga em sistemas logísticos), no sistema financeiro (concessão de crédito, monitoração de transações e prevenção de fraudes)  e na governança corporativa das empresas com mais informação e predição de resultados financeiros em distintos cenários de investimentos.

Uma pesquisa global da McKinsey sobre estratégia digital com 1000 respondentes apontou uma conexão entre organizações que construíram uma forte cultura inovadora e um modelo operacional e sua capacidade de gerar valor por meio das mais novas tecnologias digitais, incluindo IA generativa. A McKinsey aponta cinco passos para as organizações inovadoras criarem vantagens competitivas com essa tecnologia: saber fazer as perguntas certas, identificar e eliminar rapidamente as respostas erradas, criar continuamente dados proprietários, gerar uma capacidade organizacional para aprender e conectar fluxos de trabalho “sem toque humano” para aproveitar o ritmo da IA generativa.

Um pilar fundamental para a modelagem de sistemas de IA em suas distintas modalidades (descritiva, preditiva, prescritiva e generativa) é a gestão de dados, que devem ser coletados, estruturados, analisados e processados corretamente para melhor eficiência dos processos algorítmicos. Muitas organizações falham na aplicação da IA pela baixa quantidade e qualidade de seus dados.

O desafio da inovação e aumento de produtividade é enorme num cenário global altamente competitivo, mas o Brasil possui capital humano, startups e instituições acadêmicas com alto potencial criativo, instituições governamentais e setoriais com visão de futuro e grandes empresas com demandas e capacidade de investimento em projetos inovadores. É preciso somar todos os esforços nos ecossistemas de inovação, bem como a ação diligente dos agentes de governança corporativa, para a eficiência dos recursos aplicados. E a inteligência artificial se apresenta cada vez mais como poderosa aliada neste processo.

Durval Jacintho é Engenheiro Eletrônico e Mestre em Automação Industrial pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e consultor internacional em tecnologia pela DJCon, com 37 anos de experiência C-Level no mercado de tecnologia e telecomunicações. Conselho de Administração certificado pelo Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) e membro da Comissão de Ética do IBGC e da Comissão de Inovação do Capítulo São Paulo Interior. Integra o Comitê de Gestão do Hub da Gestão e o Chiefs.Group. Contato no LinkedIn: https://www.linkedin.com/in/durval-jacintho

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