Agosto Lilás: urgência de ação efetiva diante da violência contra as mulheres

Crédito: Divulgação

A autora é Lia Noletto, advogada, mestre em políticas públicas e governo pela FGV, e consultora jurídica com foco em processo legislativo

 

Mesmo com leis avançadas, Brasil segue registrando quatro feminicídios por dia e milhares de casos de violência contra mulheres, revelando falhas na prevenção e na proteção das vítimas

 

Agosto Lilás, campanha criada para marcar a luta pelo fim da violência contra a mulher e em alusão aos 19 anos da Lei Maria da Penha, não pode ser reduzido a uma mobilização simbólica. Os dados recentes mostram que, apesar dos avanços institucionais, a realidade das brasileiras segue marcada por agressões, feminicídios e impunidade.

 

De acordo com o Ministério das Mulheres, apenas entre janeiro e julho de 2025, o Ligue 180 realizou 594.118 atendimentos, dos quais 86.025 foram denúncias formais de violência contra mulheres, número 2,9% maior em relação ao mesmo período de 2024 (Agência Brasil, 2025). Esse crescimento revela que, mesmo com maior visibilidade das campanhas, o enfrentamento à violência ainda é insuficiente para reduzir os casos.

 

Segundo o mesmo levantamento, 44,3% das vítimas eram negras, enquanto 57,7% se declararam heterossexuais. Em relação aos tipos de violência, 41,4% foram casos de violência física, 27,9% psicológica e 3,6% sexual. Esses dados confirmam a sobreposição de desigualdades — sexo, raça e classe — que tornam as mulheres negras as mais vulneráveis.

 

A gravidade da situação se evidencia também nos números do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, segundo os quais 1.492 mulheres foram vítimas de feminicídio em 2024, o que equivale a quatro assassinatos por dia. A maioria era negra (63,6%), jovem (entre 18 e 44 anos) e morta dentro de casa (Governo Federal, 2025). Ou seja, o lar, que deveria ser um espaço de proteção, se transforma no local de maior risco.

 

A dimensão do problema foi reforçada em audiência pública no Senado Federal. Na ocasião, especialistas destacaram que o Brasil registra, em média, 205 estupros por dia, além dos quatro feminicídios diários já mencionados (Senado Federal, 2025). São números de um país em estado de emergência silenciosa contra mulheres e meninas.

 

Apesar da gravidade, o Brasil possui uma das legislações mais avançadas do mundo: E intensa produção de legislação de enfrentamento a violência contra a mulher, sendo a Lei Maria da Penha, considerada referência internacional pela ONU. Porém, como ressalta o próprio Ministério das Mulheres, a existência da lei não garante, por si só, a redução da violência. É necessário investimento em educação, fortalecimento da rede de apoio às vítimas, além da ampliação de políticas públicas de prevenção.

 

Uma iniciativa positiva recente foi o lançamento do Painel de Dados do Ligue 180, que disponibiliza informações detalhadas sobre o perfil das vítimas e agressores, os tipos de violência denunciados e o tempo decorrido até a denúncia (Secretaria de Comunicação da Presidência, 2025). A transparência é fundamental, mas precisa vir acompanhada de ações concretas que transformem estatísticas em vidas salvas.

 

Assim, o Agosto Lilás deve ser mais do que uma campanha de conscientização. É um alerta permanente de que precisamos atuar em rede de forma a permitir não apenas a criação de novas normas, mas a implantação, efetivação e criação de indicadores das políticas públicas recém criadas, sem deixar nenhuma mulher para trás. Os dados já gritam por si só; agora, cabe ao Estado e à sociedade responderem com firmeza, garantindo equidade, proteção, justiça e, sobretudo, dignidade.

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